terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Arenga aos Magistrados que estreiam.

 (Trecho do polêmico discurso do Juiz francês Oswald Baudot na cerimônia de investidura dos novos magistrados franceses):
"Estais empossados e advertidos. Permiti-me que também vos fale, a fim de corrigir algumas coisas que vos foram ditas e de fazer-vos ouvir algumas coisas inéditas. Ao entrar na Magistratura vos tornastes funcionários de um escalão modesto. Não levanteis muito alto a cabeça. Não vos deixeis enganar por palavras como "terceiro poder", "poder do Povo", guardiãs das liberdades públicas". Não tendes senão um poder medíocre: o de meter as pessoas na cadeia. E só vos dão este poder porque ele é geralmente inofensivo. Quando condenardes há cinco anos de prisão um ladrão de bicicletas, não estareis molestando a ninguém. Evitai abusar desse poder. Não penseis ser mais considerado por ser mais terríveis. Não julgueis que ides, como novos São Jorge, vencer o dragão da delinquência por uma repressão impiedosa. Se a repressão fosse uma coisa eficaz, há muito tempo teria alcançado seus objetivos. Se ela é inútil, como creio, não penseis em fazer carreira à custa da cabeça dos outros. Não conteis a prisão por anos ou meses, mas por minutos e segundos, exatamente como se tivésseis vós mesmos de sofrê-la.
"É verdade que entrais numa profissão em que vos exige sempre que tenhais caráter, mas entendem por isto apenas que sejais inclementes com os miseráveis. Covardes diante dos superiores, intransigentes com os subalternos este é, em geral, o comportamento dos homens. Tratai de evitar isso. A justiça é aplicada impunemente. Não abuseis da impunidade. Em vossas funções, não deveis dar exagerada importância à Lei, e de um modo geral desprezai os costumes, as circulares, os decretos e a jurisprudência. Deveis ser mais do que o Tribunal de Justiça, sempre que se apresentar uma ocasião. A Justiça não é uma verdade estagnada em 1810. É uma criação perpétua. Ela deve ser feita por vós. Não espereis o sinal verde de um ministro, ou do legislador, ou das reformas sempre em expectativa. Fazei vós mesmos a reforma. Consultai o bom senso, a equidade, o amor do próximo, antes da autoridade e da tradição. A lei se interpreta. Ela dirá o que quiserdes que ela diga. Sem mudar um til, pode-se com os mais sólidos considerandos do mundo, dar razão a uma parte ou a outra, absolver ou condenar à pena máxima.Desse modo que a lei não vos sirva de álibi.
"Verificareis, aliás, que à revelia dos princípios estabelecidos, a Justiça aplica extensivamente as leis repressivas e restritivamente as leis liberais. Procedei de modo contrário. Respeitai as regras do jogo quando ela vos freia. Sede bons jogadores, sede generosos. Será uma novidade. Não vos contenteis de cumprir os deveres do ofício. Vereis desde logo que, para ser um pouco úteis, devereis abandonar os caminhos batidos. Tudo o que fizerdes de bom será um acréscimo. Gosteis ou não, tendes um papel social a desempenhar. Sois assistentes sociais. Vossa decisão não termina numa folha de papel.Corta na carne viva. Não fecheis vossos corações ao sofrimento nem vossos ouvidos ao clamor. Não sejais desses juízes menores que só querem tratar de processos pequenos. Não sejais árbitros indiferentes acima de tudo e de todos. Tende sempre a porta aberta a todos. Há trabalhos mais úteis do que o de caçar essa borboleta - a verdade - ou de cultivar essa orquídea - a ciência jurídica.
"Não sejais vítimas de vossos preconceitos de classe , religiosos, políticos ou morais. Não penseis que a sociedade seja intangível, a desigualdade e a injustiça inevitáveis e a razão e a vontade humanas incapazes de qualquer mudança. Não acrediteis que um homem seja culpado de ser o que é nem que ele dependa apenas de si mesmo para ser de outra forma. Em outras palavras - não o julgueis. Não condeneis o ébrio. O alcoolismo, que a medicina não sabe curar não é uma escusa legal, mas é uma atenuante. Por serdes instruídos não desprezeis o iletrado. Não apedrejeis a preguiça, vós que não trabalhais com as mãos. Sede indulgentes para com os demais seres humanos. Não aumenteis suas aflições. Não sejais dos que aumentam a aflição do aflito.
"Sede parciais. Para manter a balança entre o forte e o fraco, o rico e o pobre, que não têm o mesmo peso, é preciso que calqueis a mão do lado mais fraco da balança. Essa é a tradição capetiana. Examinai sempre onde estão o forte e o fraco que não se confundem necessariamente com o delinqüente e sua vítima. Tende um preconceito favorável pela mulher contra o marido, pelo filho contra o pai, pelo devedor contra o credor, pelo operário contra o patrão, pelo vitimado contra companhia de seguros, pelo enfermo contra a Previdência Social, pelo ladrão contra a polícia, pelo pleiteante contra a Justiça. E tende um último mérito: perdoai este sermão da montanha a vosso colega dedicado."

Fonte:
Inserto em artigo publicado pelo jornalista Mello Mourão no jornal "Folha de São Paulo" de 7/3/1979.

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Pratos

Por mais chato que seja lavar pratos, se você demorar a lavar ficará mais dificil ainda. Quanto mais tempo você  deixar os pratos esperando, mais dificil será lavá-los. A vida é assim. Uma coisa que é potencialmente fácil de corrigir logo depois que aconteceu (uma palavra indelicada que você tenha dito a seu pai, uma mentira que você tenha contado a um amigo, uma atitude incensível com sua namorada) pode se tornar uma complicação bem difícil de resolver se você não lidar com ela de imediato. É melhor lavar logo os pratos. O que você tem tentado varrer  para debaixo do tapete? Quais os assuntos não resolvidos que você preferiu deixar para depois, mas que, no fundo, sabe que é melhor enfrentar logo? Mãos á obra. Saia da inércia e lave os pratos. Melhor fazer agora do que  postergar.

SHMUEL LEMLE

terça-feira, 19 de julho de 2011

A ajuda em doses certas

O mestre encarregou o discípulo cuidar do campo de arroz. No primeiro ano, o discípulo vigiava para que nunca  faltassse a água necessária. o  arroz  cresceu e a colheita foi boa. No segundo ano, ele acrescentou um pouco de fertilizante. O arroz  cresceu rapidamente e a colheita foi maior. No terceiro ano, ele botou mais fertilizante. A colheita foi maior ainda mais o arroz  nasceu pequeno. " Se continuar aumentando a quantidade, não terá nada de valor no ano que vem", disse o mestre. " Você fortalece alguem quando ajuda um pouco. Mas o enfraquece se ajuda muito."

Jornal  Extra RJ 19/07/2011

domingo, 17 de julho de 2011

O sapo surdo

                                
 Todos os anos, na floresta das águas, havia uma grande festa sempre quando chegava o inverno.

Todos iam para uma lagoa e lá faziam diversas competições.

Então veio a surpresa.

Quando todos os animais estavam presentes, perceberam no centro da lagoa uma enorme construção coberta. Então várias folhas foram puxadas e apareceu no meio da lagoa uma grande torre.

A multidão de animais aplaudiu.

Era a competição da subida dos sapos, uma novidade naquele ano. O primeiro sapo a chegar ao alto da grande torre seria o sapo vencedor.

Muitos sapos pularam na água, cem, duzentos, trezentos. Então começaram a saltar na torre para escalá-la.

Mas a torre era alta e lisa e a maioria dos sapos começaram a cansar e desistir.

A multidão que não queria nenhum vencedor passou a gritar :

- Vai cair, vai cair, vai cair !

E caíam de dez a vinte sapos de vez. A multidão ria.

E o tempo ia passando. Agora, a multidão gritava alegre fazendo espetáculo, bastava ver um sapo se destacar na subida e o coro ficava mais alto.

- Cai, cai, cai - e lá iam os sapos caírem. Muitos sapos cansados já nadavam para as margens e saíam da lagoa.

A multidão ainda gritava para os poucos que restavam, então um dos sapos começou a se aproximar do cume da alta torre.

A multidão percebeu e começou a gritar ainda mais alto:

- Vai cair, vai cair, vai cair !

Finalmente, o sapo chegou ao cume e se tornou campeão.
Raivosa e cheia de inveja daquela façanha, a multidão quis saber o mistério do campeão. A resposta foi dada por seu primo que disse a uma garça repórter: ele é forte, só tem um defeito, é surdo.

(Acredite em si, lute, a inveja e o negativismo alheio são nossos piores inimigos)


Bérgson Frota
(Escritor)