sábado, 28 de agosto de 2010

O primeiro carro do Ceara

Demitri Túlio




Há 100 anos, as ruas de carroças, cavalos, bondes elétricos e a burros de Fortaleza ensaiavam pela primeira vez andar de automóvel. O primeiro carro que chegou por aqui, para mudar a noção de tempo, espaço e velocidade, foi um Rambler segunda mão e de fabricação norte-americana.



Veio encomendado a 8 mil réis dos Estados Unidos, a bordo do vapor inglês Cearense, e foi desembarcado num 26 de março de 1909. Ano em que fomos iniciados, para o bem e para o mal, no corre-corre dos homens motorizados...



Já contei isso por aqui com a memória de Raimundo de Menezes. Mas como o centenário passou batido no 2009, que se foi rápido, volto a escrever sobre o dia em que Fortaleza passou a se locomover, apressada, sob quatro rodas e um motor. E tentem imaginar a imensidão da província para um carro só se ``deambular``... E há um detalhe. A novidade importada pela Empresa Auto Transporte, dos pioneiros Meton de Alencar e Júlio Pinto, não pegou na chave de saída. Quer dizer, a manivela não funcionou e o Rambler teve de ser rebocado por um jumento da praia da Alfândega até o edifício do cinema Cassino Cearense, na Major Facundo, no antigo Palhabote.



Provavelmente, um animal que serviu a um dos 25 bondes a burros da Companhia Ferro Carril do Ceará que lentamente trafegavam pela cidadezinha. A partir de 1912 os jumentos, a exemplo de Chibata e Chico, passaram a ser substituídos pelos elétricos da, agora, The Ceará Trainway, Light and Power Co. Ltda.



Pois foi um desses personagens da cidade antiga que arrastou, a cordas, o Rambler. Acompanhou a procissão, afogueado, o canelau que se fez magote por não se conter em curiosidades e burburinho com a geringonça dos capitalistas.



Dizer a verdade, contada de lá até aqui, o Rambler não estaria de todo no prego quando desceu no porto, mesmo já sambado. Carecia de alguém que entendesse de motor e soubesse fazer desembestar o automóvel. Se quiserem assim, os nossos primeiros mecânicos foram Roberto Muratori e o velho Meireles.



Deram vida ao bicho e um português, o caixeiro Rafael Dias Marques, da Casa Bordalo, meteu-se a primeiro piloto de um carro a combustão no Ceará. Era a inauguração de um novo tempo que estancou poucos metros adiante. Pifou e voltou ao Cassino Cearense.



Somente com Clóvis Meton e Alfredo Euterpino Borges, mecânicos de 24 horas e manual, que se fez rodar o Rambler na via pública de areia ou pedra. Começou aos trancos e sopapos à noite. Assombrando com os faróis os acostumados com a pouca iluminação pública de Fortaleza.



Vivia mais no prego que rodando. Mas foi até o Alagadiço, à Estação dos Bondes. Perdeu a tampa do radiador na estrada de Messejana e conseguiu a proeza de ir às festas de Canindé. Bem verdade que foi em um vagão até a Estação Ferroviária de Baturité e de lá seguiu rodando, por 24 horas, até a cidade de São Francisco do Ceará. Seu motor findou fazendo moer farinha numa bolandeira na Porangaba.



E assim começamos a andar feito automóvel. Depois do Rambler, vieram outros e outros e outros... Daí nasceram os semáforos, as placas, os asfaltos de ir e vir, as rodovias de correr... Ficamos apressados

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